NOVO REAJUSTE NOS PREÇOS TERÁ FORTE IMPACTO NA CADEIA
Estimativa aponta necessidade de correção imediata de até 15% nos preços do aço em abril.
O novo sistema de preços do minério de ferro da Vale, com correção atrelada a um índice baseado no mercado à vista e com reajustes trimestrais, o qual foi encaminhada às siderúrgicas neste mês, pode provocar uma profunda mudança na comercialização de toda cadeia mínero-siderúrgica caso seja acatado pelas usinas de aço, avaliam analistas e consultores ouvidos pelo Valor.
As siderúrgicas terão que estender as negociações das novas regras a clientes de grande porte, como a industria automobilística, de bens de capital e de eletrodomésticos, avaliam analistas. Para Pedro Galdi, da SLW Corretora, o novo padrão de reajuste do minério, que segue o padrão adotado também para o carvão – os dois insumos mais pesados no custo do aço – vai “injetar inflação na veia da economia”.
De acordo com um executivo de uma siderúrgica, o impacto do aumento do minério, considerando o mix de finos (tipo sinter feed) e pelotas é da ordem de R$ 180 por tonelada de aço. resultado disso é um aumento imediato 12% a 15% no preços do aço, dependendo do produto e cliente. “Quando forem conhecidos os novos preços de carvão, os aços devem ser reajustados de novo”.
Fonte do setor siderúrgico que acaba de voltar da China informou ao Valor que as negociações atualmente em curso entre a Vale e seus clientes internacionais, com destaque para os chineses, estão provocando forte reação das usinas de aço por causa da ordem de grandeza envolvida no processo de alta do minério (mais de 100%) e por conta do novo sistema trimestral para os reajustes. “O ‘benchmark’ (preço de referência para contratos de longo prazo reajustado a cada ano, há 40 anos) trazia uma estabilidade grande à cadeia produtiva do aço. Agora, depois de saírem do estresse provocado pela crise, as siderúrgicas estão considerando este processo de revisão mais curta do preço um forte complicador do seu negócio”, avalia.
O cenário mais provável para um consultor da área siderúrgica é a aceitação pelas siderúrgicas da proposta da Vale, já que nos próximos dois a três anos o mercado de minério estará tendendo para o lado do vendedor. “Se a Vale já formou preços para o segundo trimestre, certamente as negociações estão em processo final, pois 1º de abril está próximo”. Mas mesmo se tratando da criação de um índice de preços (Iodex), ele não afasta a negociação cliente a cliente. “No acerto final, a mineradora vai resolver com sua clientela caso a caso, mesmo tendo enviado já uma tabela de preços para o minério a vigorar entre abril e junho”.
O especialista argumenta que o mundo está se recuperando da recessão de forma desigual e é diferente a Vale negociar com uma industria que está num país em recuperação e outra que está ainda numa economia reprimida. Por isso, a Vale vai ter que ter sintonia fina para fechar acordos nas novas bases e evitar reações em cadeia contra sua proposta, alerta ele.
O mercado mostrou otimismo com a notícia sobre a alta do minério, tanto que a ação teve alta na Bovespa e os ADRs subiram em Nova York. Para um analista de mineração de banco estrangeiro, o que está acontecendo agora com o minério já ocorreu com todas as commodities, ou seja, ter as cotações revistas em prazos menores. E o mercado à vista reflete bem melhor a demanda atual pelo minério.
A Vale divulgou ontem comunicado onde confirma que está buscando estabelecer uma nova política comercial com seus clientes, envolvendo nesse processo maior flexibilidade em relação aos preços do minério, numa tentativa de se adaptar ao mercado atual. Na nota, a mineradora informou que não enviou nenhum comunicado ao “mercado de capitais” sobre preços dos seus produtos. Evitou, porém, comentar sobre a proposta enviada para seus clientes, como antecipou o Valor. “A Vale, conforme documentos arquivados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e demais órgãos reguladores, já informou oficialmente que implementou nos últimos tempos uma nova política comercial, envolvendo, entre outras coisas, uma abordagem mais flexível com relação aos preços do minério de ferro, inclusive quanto a sua forma de venda (C&F, FOB)”, afirmou. A Vale considera na nota que “flexibilidade esta plenamente aplicável aos mercados e clientes nas mais diversas geografias em que atua” (Valor, 24/3/10)