Belo Monte vai operar com 40% do potencial
Usina será a menos eficiente do País, o que provoca dúvidas sobre a sua viabilidade.
Com a geração média de apenas 40% de sua capacidade total, Belo Monte será a usina menos eficiente entre as grandes hidrelétricas brasileiras. O aproveitamento é 30% inferior à média das seis usinas brasileiras com mais de 3 mil megawatts (MW). O fraco desempenho é um dos fatores que amplia o risco do projeto, cujo orçamento ainda é razão de divergência entre o governo e as empresas.
Na semana passada, o governo sofreu mais um revés com a desistência de duas das principais construtoras do País, a Camargo Corrêa e a Odebrecht, que participaram da elaboração do projeto desde o início. Diante disso, vem estudando medidas que possam garantir a atratividade do leilão, embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha afirmado que as obras serão tocadas com ou sem investidores privados.
A ociosidade da usina, provocada pelo regime de chuvas do rio Xingu, é uma das críticas feitas por organizações ambientalistas ao projeto. É resultado da falta de reservatório, que poderia acumular água para o período de seca na bacia do Xingu. Dessa forma, a usina operará a plena carga durante os meses de chuva, mas terá grande capacidade ociosa na seca, quando produzirá menos de 3 mil MW.
Assim, com potência de 11.233 MW, Belo Monte vai inserir no sistema elétrico uma média anual de apenas 4,571 MW médios. No setor elétrico, há dúvidas com relação ao tema, uma vez que os investimentos podem ser desproporcionais ao volume de energia gerada durante o ano.
“Se os valores ficarem dentro do estimado pelo governo (investimentos de R$ 19 bilhões e preço da energia de até R$ 83 por megawatt-hora), está bom”, diz o diretor da Coppe/UFRJ, Luiz Pinguelli Rosa, destacando que são valores compatíveis com as usinas do Rio Madeira. No mercado, comenta-se que a obra não sai por menos de R$ 30 bilhões.
Nesse caso, Belo Monte terá um custo por MW médio bem superior ao das usinas do Madeira. Com um investimento de R$ 30 bilhões, cada MW médio de Belo Monte sairá a R$ 6,5 milhões, contra R$ 4,2 e R$ 4,4 milhões em Jirau e Santo Antônio. Se o orçamento estimado pelo governo for respeitado, o custo investido por MW médio de Belo Monte será de R$ 4,1 milhões.
Santo Antônio terá uma geração média anual equivalente a 67,9% de sua potência total, de 3.150 MW. Já Jirau tem uma taxa de utilização de 59,2%. No caso de Belo Monte, esse valor cai a apenas 40%. Na média, as seis maiores hidrelétricas brasileiras asseguram uma geração de 57,7% de sua potência.
Evolução. A conta considera as duas usinas do rio Madeira mais Itaipu, Tucuruí, Ilha Solteira e Xingó. Sobre as duas últimas, Belo Monte tem desvantagem comparativa, uma vez que elas têm reservatório. Desenvolvido desde os anos 80, o projeto mudou ao longo dos anos e ficou sem reservatório de água, para reduzir o impacto ambiental da obra.
A configuração final, porém, continua gerando protestos. O governo corre para realizar o leilão a tempo de evitar a temporada de chuvas e começar logo as obras, a tempo de ligar a primeira turbina ainda em 2015.
É consenso no mercado que o País precisará da energia da usina, mas tantos problemas começam a levantar dúvidas sobre sua apresentação como única alternativa para o suprimento de energia. Na própria Eletrobrás, há quem discorde de tamanho esforço. “Talvez fosse mais fácil construir quatro usinas nucleares e resolver logo isso”, diz um executivo da estatal, que preferiu não se identificar.
“É um daqueles projetos que não se sabe muito bem por que foi criado e menos ainda por que se mantém tanto empenho”, diz outro executivo graduado do setor. “A taxa de utilização da usina é desproporcional ao volume de investimento e de encrencas”, completa. Para seus defensores, porém, Belo Monte terá papel fundamental ao permitir a economia de água nos reservatórios das regiões Sudeste e Centro Oeste, uma vez que operará a plena capacidade justamente no período de seca no resto do País (O Estado de S.Paulo, 11/4/10)